quarta-feira, setembro 14, 2005

A vida por um fio

Não somos nada. Somos tudo e não somos nada. Somos tudo para algumas pessoas e não somos nada para outras. Somos a mesma pessoa. Uma pessoa que por vezes tem tudo e sente nada. A mesma pessoa que outras vezes sente tudo e não tem nada.

Não somos nada. Somos o que nos deixarem ser. Somos até o fio se rebentar. Tudo está por um fio! Desengane-se aquele que pensa que tem tudo controlado.

Não somos nada. Não controlamos o rumo das coisas. Nem sempre nos conseguimos controlar a nós próprios. Somos fracos. Somos frágeis.

A qualquer momento o que nos mantém vivos pode parar. Algo tão simples como respirar, pode por e simplesmente não acontecer. Um gesto tão simples e rotineiro pode ser interrompido. Porquê?

Acontece? Não, não acontece por acaso.

Não somos nada, mas temos de dar o máximo. Em cada novo dia, novas exigências. Em cada novo dia, somos postos à prova. Uns mais, outros menos. Uns com mais apetência do que outros. Uns com maior adaptabilidade do que outros. A verdade é que não somos nada, mas tudo depende de nós. A nossa vida depende de nós. A vida, a forma como vemos a vida, a forma como levamos a vida. A forma como queremos ser e fazer os outros felizes.

Não somos nada, mas aquilo que somos depende de nós. Não estamos sozinhos, mas nisto só dependemos de nós. É preciso força, muita força. Temos de ser fortes. Temos de seguir o que queremos com persistência e coerência em tudo o que fazemos.

Não somos nada, mas o pouco que somos é o que temos. É com o que podemos contar. Não basta sermos fortes. De que serve a força se não conseguimos manter a nossa respiração. De que vale, se não nos conseguimos manter vivos.

Somos o que somos. Muito ou pouco. Tudo ou nada. Somos o que somos. Exigem de nós o máximo e não sendo suficiente, nós próprios continuamos a exigir mais e mais. É bom. É ter sempre objectivos, é ter sempre um rumo a seguir. Mas cuidado, os limites somos nós que impomos. Somos nós que temos de saber até onde podemos ir. Não podemos deixar que nos roubem o ar que respiramos, não podemos deixar que nos tirem a nossa vida. Não podemos colocar tudo o resto à frente da nossa vida. Daquilo que somos.

Somos fracos. Somos frágeis. Temos de aceitar isso. Não somos perfeitos e, se em alguns aspectos, podemos aperfeiçoar-nos, noutros nada podemos fazer a não ser conviver com esse facto. Não somos fracos, porque temos fraquezas. Somos fracos porque não sabemos lidar com as fraquezas.

Somos o que somos e não devemos ter vergonha do que somos. Somos o resultado de um amor. Somos o resultado de muito desejo. Ter vergonha do que somos é ter vergonha de todos os sentimentos dos quais nós surgimos.

Não somos nada. Somos apenas o resultado do que existe de mais bonito na vida. A vida. A mesma vida que não conseguimos viver. A vida que sem nos apercebermos, pode escapar-nos por entre os dedos. O que fazer?

Tudo está por um fio e a cada dia que passa esse fio está mais fino. O tempo não volta atrás. Resta o tempo que aí vem. Resta o amanhã. Está nas nossas mãos agarrar o fio e esperar que ele seja suficientemente forte para aguentar o peso da nossa vida. O peso por não sabermos viver e por não valorizarmos o facto de estarmos vivos e constantemente, colocarmos, essa mesma vida em perigo.

Cristina Cabral